[Texto de introdução a uma nova publicação que está no prelo]
Desde 1990 vem-se desenvolvendo na Universidade do Minho uma linha de investigação e inovação pedagógica sobre o Ensino Experimental das Ciências para crianças. No trabalho continuado ao longo de duas décadas desenvolvemos uma teoria, uma prática de sala de aula e os instrumentos didácticos de suporte ao que designamos de Ensino Experimental Reflexivo das Ciências (EERC). Nesse processo de ensino parte-se de questões, problemas e fenómenos que se tornam objecto de reflexão e investigação experimental. As situações experimentais são geradoras de diferentes ideias que suscitam a comunicação, a discussão e a argumentação entre os alunos e o professor. E todo o processo é mediado pela acção intencional do professor, que promove uma atmosfera de estimulação do pensamento e da criatividade, baseada em princípios de respeito mútuo, de liberdade de comunicação e de expressão da afectividade.
Os resultados da nossa investigação* demonstram de forma clara que, nesta forma de ensinar, as crianças desenvolvem as suas capacidades cognitivas, melhoram a qualidade das suas aprendizagens no domínios da língua e das ciências**, desenvolvem competências de resolver novos problemas do quotidiano e tornam-se mais reflexivos, face aos seus pares. Os alunos tornam-se pensadores activos e críticos, desenvolvem competências sociais, promovem a sua auto-estima, a motivação intrínseca, a autonomia, a capacidade de tomar decisões e aprendem a lidar de forma positiva com as situações de insucesso. E vivem a aprendizagem com alegria e elevada satisfação pessoal. Esta vivência de aprendizagem promove a inteligência emocional dos alunos, o que eleva o desempenho do seu intelecto e faz deles sujeitos com mais elevada consciência de si próprios.
Propomos neste guia uma investigação orientada pelo professor em que aos alunos:
1. Exprimem os seus conhecimentos e ideias do quotidiano sobre o tópico da aula
2. Discutem essas ideias e fazem previsões de resultados experimentais
3. Testam experimentalmente as suas previsões: plano + execução experimental
4. Fazem observações experimentais e fazem os correspondentes registos
5. Contrastam as previsões com as observações
6. Apresentam novas ideias explicativas e discutem-nas com os seus pares e o professor
7. Ampliam o conhecimento de todos em discussão/reflexão focalizada pelo professor
8. Consolidam e expandem o conhecimento em forma de trabalho escrito na ficha do aluno
As questões-chave apresentadas no início de cada actividade, são as questões que pretendem sugerir ao professor os aspectos centrais a serem objecto de estudo e investigação experimental. As aprendizagens podem ter incidência em diferentes domínios: conceptual, processos científicos e técnicas e procedimentos; isso está assinalado com X em cada tabela de aprendizagens. O domínio conceptual diz respeito aos conhecimentos adquiridos; o domínio dos processos científicos diz respeito às capacidades de construção do conhecimento científico aplicadas e desenvolvidas; o domínio das técnicas e procedimentos diz respeito ao desenvolvimento de destrezas de manipulação dos instrumentos e dos materiais e à execução dos procedimentos experimentais. Na secção O professor ensina os alunos a investigar são apresentadas orientações que pretendem ajudar o professor a conduzir as actividades de ensino experimental.
Estas práticas foram testadas e validadas por outros professores, em diferentes anos de escolaridade. Faço pois um apelo entusiástico a todos para que ousem dar aos seus alunos a oportunidade de realizarem os percursos de aprendizagem aqui propostos.
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*Sá, J. G. (1996). Estratégias de Desenvolvimento do Pensamento Científico em Crianças do 1º Ciclo do Ensino Básico. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Braga; Sá, J. (2002). Renovar as Práticas no 1º Ciclo pela Via das Ciências da Natureza. Porto: Porto Editora, 2ª edição; Sá, J. com Varela, P. (2004). Crianças Aprendem a Pensar Ciências: uma abordagem interdisciplinar. Porto: Porto Editora; Sá, J. & Varela, P. (2007). Das Ciências Experimentais à Literacia: uma proposta didáctica para o 1º ciclo. Porto: Porto Editora; Varela; P (2010). Ensino Experimental das Ciências no 1º Ciclo: construção reflexiva de significados e promoção de competências transversais. Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Braga.
**Não testámos a hipótese de que o EERC promove melhores desempenhos em Matemática, mas a experiência de sala de aula torna essa hipótese tão plausível quanto as que foram testadas. As capacidades cognitivas são uma ferramenta com que o aluno opera na construção das aprendizagens de diferentes domínios curriculares, o que sustenta essa hipótese.