quarta-feira, 22 de abril de 2009

FLUTUAR-AFUNDAR! As concepções das crianças-II

[Continuação de Flutuar-afundar: concepções da criança I]

3. Flutuar ou afundar é um atributo do material de que é feito o objecto, que se transmite ao objecto

ferro sempre vai ao fundo; madeira sempre flutua.

Muitas crianças desenvolvem esta teoria quando se dão conta de que há objectos “grandes” e “pesados”, feitos de uma grande quantidade de material “leve”, que afinal flutuam. Um bocado de madeira flutua “porque é leve”, mas um tronco de árvore é “pesado” e no entanto também flutua. O esquema explicativo leve-flutua/pesado-afunda é posto em causa porque há objectos reconhecidos como “pesados” que afinal flutuam. Basta para isso ajudar os alunos e evocar determinados conhecimentos do seu quotidiano, como antes foi referido.

4. Flutuar ou não depende da quantidade de água e do nível da água

Numa turma do 4º ano, (em que se desenvolvia a investigação) com a devida anuência da professora, introduzi a seguinte questão:

- Porque razão há objectos que flutuam e objectos que se afundam?

Foi sugerido aos alunos que discutissem a questão em grupo, o que era já um hábito de muitas aulas anteriores. Ao fim de alguns minutos os grupos comunicam as suas ideias ao grupo-turma, através do respectivo porta-voz e de algumas intervenções complementares de outros alunos. No grupo 1 são apresentadas as seguintes ideias: o volume e o nível da água têm importância; se for mais leve flutua e mais pesada afunda; a quantidade de água tem importância, flutua melhor em muita água.

Nesta narrativa, para além do esquema explicativo muito corrente pesado/afunda-leve/flutua, surge com bastante clareza a ideia, já identificada em adultos, segundo a qual quanto maior a quantidade de água maior é a probabilidade de o objecto flutuar. O nível do líquido surge também como factor distinto da quantidade de água: acredita-se que quanto maior for a distância entre a superfície livre do líquido e o fundo do recipiente, mais facilmente o objecto flutuará.

Perante tais ideias, as questões poderão despertar nos alunos um renovado olhar.

- Então achas que o objecto flutua melhor em muita água! Ora no mar há imensa água; será que no mar nenhum objecto vai ao fundo?

- E no alto mar, é muito fundo, tem muita água por baixo! Será que uma pedra deixada cair de um barco no alto mar fica a flutuar, à superfície da água?

PS:.[Continua em Flutuar-afundar: concepções da criança III]

terça-feira, 21 de abril de 2009

FLUTUAR - AFUNDAR! As concepções das crianças-I

1. O objecto flutua porque:

é fino; é plano; é comprido; é gordo, é pequeno; é leve…

São “explicações” que começamos a ouvir nas crianças por volta dos 4/5 anos e que em muitas delas se prolongam no 1º ciclo. Referem-se a uma característica visível do objecto, tendo um carácter descritivo e não explicativo. A característica que a criança invoca como explicação é o elemento perceptivo do objecto que aos seus olhos assume especial relevância. Por isso, tais “explicações” têm um carácter muito particular, variando, na mesma criança, de objecto para objecto, e, no mesmo objecto, de criança para criança.

2. Objectos “leves” flutuam e objectos “pesados” vão ao fundo

Trata-se de uma primeira tentativa de generalização, que se baseia na experiência quotidiana das crianças com objectos flutuantes, que na linguagem corrente se dizem “leves” (objectos feitos de madeira, de cortiça, de plástico, etc.) e com objectos não flutuantes, que vulgarmente se dizem “pesados” (objectos feitos de metal, pedras, etc.).

Porém, é muito frequente verificar-se que o esquema mental leve-flutua/pesado-afunda leva as crianças a mudarem de opinião acerca do que é leve ou pesado, formulando o seu juízo “definitivo”, depois de observarem o comportamento do objecto na água. Quando assim é, ser leve ou pesado não é o que determina o comportamento do objecto na água; é antes o comportamento do objecto que determina o juízo quanto ao que é ser leve ou pesado.

Significa isto que, na visão da criança, causa e efeito se confundem, podendo permutar entre si. Porém, a criança dá-se conta de que este jogo de inter-mutabilidade entre causa e efeito está viciado, quando é confrontada com situações que ela reconhece não fazerem sentido, como por exemplo:

- Bom, tu achas que o que é pesado afunda e o que é leve flutua! Então um grão de areia é pesado e um navio é leve?!

As crianças facilmente percebem que algo "não bate certo"... Trata-se de trazer à consciência das crianças conhecimentos que elas já possuem, para se promover o confronto entre esses conhecimentos e a teoria que estão a sustentar no momento. A consciência da contradição estimula a actividade mental de construção de novas teorias, bem como o confronto de diferentes pontos de vista. Aquele paradoxo gera grande tensão sócio-cognitiva nos alunos, o que põe em marcha o seu potencial reflexivo e criativo.

PS:.[Continuação em Flutuar-afundar: concepções da criança II]

sábado, 4 de abril de 2009

As boas questões conduzem ao conhecimento!

Num pequeno grupo de crianças de 5 anos apresentei-lhes um frasco de vidro e travei com elas o seguinte diálogo:

P - O que há dentro deste frasco?, perguntei.

R - Não tem nada, disseram.

P - Nada? Já ouviram falar de ar?, perguntei.

R - Já.

P - Há ar nesta sala?

R - Não, só se abrirmos uma janela.

P - Mas vocês respiram ou não dentro da sala?

R - Sim, respiramos.

P - E o que é preciso para vocês respirarem?

R - Ar.

P - Então o que é preciso haver na sala para vocês poderem respirar?

R - É preciso ar.

P - Então na sala há ar ou não?

R - Há.

P - E dentro deste frasco o que há?

R - Tem ar.

Este exemplo de questionamento revela que as crianças são frequentemente contraditórias, mas isso não significa que não tenham apreço pela lógica. A contradição reside na ausência de consciência da contradição. As boas questões estimulam as crianças à reflexão, conduzindo assim à tomada de consciência da contradição - esforçam-se então por eliminar a contradição logo que dela tomam consciência.

Neste caso, as crianças compreendem que não é compatível o conhecimento de que respiram com a ideia de que não há ar na sala. Isso leva-as ao reconhecimento de que existe ar na sala e que sendo assim será natural que exista ar no frasco. A simples reflexão das crianças, pela via do questionamento do adulto, conduz ao conhecimento de que há ar na sala, sendo assim abandonada a ideia contrária inicial.